Quem não conhece a realidade rural do Brasil, e nunca procurou se informar a respeito, não sabe, mas os agricultores familiares na verdade são extremamente representativos. Eles podem não ocupar espaços gigantescos como o das grandes fazendas, mas são eles os que mais produzem comida para a família brasileira.
Assim, 70% do que vai para o prato do brasileiro é produzido pela agricultura familiar: mandioca, feijão, arroz, leite, milho, café, trigo, suínos e aves.
No Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2006), verificou-se que a agricultura familiar brasileira corresponde a 84,4% das unidades de produção.
Mais empregos na agricultura familiar
Apesar disso, ela ocupa pouco mais de 24% da área e é responsável por cerca de 70% dos empregos no campo. Além disso, responde pelo fornecimento da maior parte dos alimentos básicos aos brasileiros.
Além disso, se olharmos para o mundo todo, em alguns países da América Latina e Caribe, a agricultura familiar pode representar mais de 80% das propriedades agrícolas.
Isso segundo o levantamento feito pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). O estudo também mostra que mais de 60% da produção total de alimentos e mais de 70% de empregos na zona rural são gerados na agricultura familiar.
São homens e mulheres que enfrentaram problemas ecológicos e sociais, cuja magnitude ameaçava a sua própria reprodução social como agricultores e a de sua natureza próxima (JOLLIVET, 1999).
Problemas que ameaçavam, e ainda ameaçam, a base material de sua existência – a terra em que vivem. Bem como a qualidade do solo, sua disponibilidade de água, seus recursos gerais para produzir.
E o restante?
Bom, o restante, que ocupa 76% da área do campo do país, são os chamados monocultores exportadores – soja, suco de laranja, açúcar, celulose, café, algodão e gado. Mas, na realidade, os latifundiários não empregam mais do que 35% dos trabalhadores rurais.
Além disso, os trabalhadores de latifúndios são os mais mal pagos do Brasil. E quando não há trabalho escravo – sim, isso ainda existe. A chamada “Lista Suja”, do trabalho escravo bateu o recorde de condenados por esse crime. São 500 escravagistas listados. Destes, 36%, ou seja 180 no total, são pecuaristas.
Apesar de produzirem menos alimento, empregarem poucos trabalhadores, poluírem o meio ambiente pelo uso intensivo de agrotóxicos, os ruralistas recebem muito dinheiro do governo.
Só no Plano Safra 2011/2012, os fazendeiros receberam financiamento de R$ 107 bilhões, contra apenas R$ 16 bilhões para a agricultura familiar.
Contexto histórico
A “questão agrária no Brasil” se constitui como elemento central da nossa formação histórica. Desde os momentos iniciais da ocupação do território do país pelos portugueses, estabeleceu-se essa forma de propriedade de terra e de apropriação de riqueza fundamentada no latifúndio.
Do estudo do período colonial, sabemos que esse modelo de propriedade foi criado em 1532, a partir da legislação que criou as Capitanias Hereditárias.
Claro que ao longo do tempo ocorreram mudanças, mas é importante fazer uma relação com a política que formou a estrutura agrária no país. É interessante verificar a consequência disso na maneira como os agricultores familiares são considerados hoje.
É dessa estrutura que surgem diversos “conflitos de terra” que se estendem pela história, ocorridos entre pequenos agricultores tradicionais – camponeses, quilombolas e indígenas – e grandes proprietários de terras.
Alguns exemplos que podemos citar são as Guerras Guaraníticas, o Quilombo dos Palmares, a Cabanagem, a Balaiada e a Guerra de Canudos.
Hoje, o principal ator que dá continuidade à essa luta histórica em torno da “questão agrária” é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Para além de toda a polêmica que envolve essa organização, é importante destacar aqui que se tratam de milhares de famílias em assentamentos. Elas são responsáveis pela produção de toneladas de alimentos para as cidades.
No ano passado, 2017, 22 dos assentamentos, envolvendo 616 famílias gaúchas, foram reconhecidos oficialmente como o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.
Só no município gaúcho de Nova Santa Rita, 4 mil alunos das 16 escolas municipais consomem alimentos orgânicos adquiridos pela prefeitura diretamente dos agricultores.
Agroecologia e o uso de agrotóxicos
A agricultura familiar caminha cada dia mais para a certificação de suas produções orgânicas, baseada no modelo chamado de agroecologia.
Como o próprio nome já diz, a agroecologia parte de uma perspectiva ecológica, procurando maximizar a produção. Mas ela também busca a otimização do sistema nos vários aspectos socioculturais, econômicos e técnicos.
A base do conhecimento une os saberes e práticas tradicionais – justamente dos povos mais antigos e das culturas populares – com os científicos, visando à agricultura efetivamente sustentável.
Já o agronegócio, das grandes fazendas, é monocultor – ou seja de uma única cultura – que ao invés de aproveitar os recursos naturais do local, o altera para produzir.
Um modelo químico-dependente: quanto maior o uso de fertilizantes, maiores os danos ao solo, à flora e à fauna, que levam a necessidade de mais venenos e fertilizantes.
Hoje cada brasileiro consome 7,3 litros de agrotóxicos por ano. O recente PL do Veneno, em curso no Congresso Nacional, quer permitir no nosso país o registro de agrotóxicos mais perigosos – que são proibidos nos outros países do mundo – e ainda com mais facilidade do que já é atualmente.
Dicas Enem
O tema agricultura familiar está presente na maioria dos vestibulares e do Enem. Portanto, reforce seus estudos com a história dos movimentos do campo, especialmente os conflitos ocorridos no passado.